Surdos-Mudos em Celebração Eucarística na Fajã de Baixo

Nesta nossa sociedade, de pseudo-modernidade travestida e apostada na auto-degradação dos valores fundamentais das suas ancestrais células-base, que são as famílias, é reconfortante saber que continuam a existir obras e movimentos da Igreja, com membros determinados a dar nobres exemplos de vida e a demonstrarem que vale a pena lutar, fazer sacrifícios e percorrer mesmo os caminhos mais difíceis para fazer valer os sólidos valores morais, sobretudo porque acreditam que podem ajudar a construir um mundo mais solidário, mais amigo, mais humanizado – um mundo melhor.

 

Um destes movimentos é o das Equipas de Nossa Senhora (ENS), comunidades vivas de casais que procuram reflectir o amor de Cristo, há 70 anos fundado em França pelo Pe. Henri Caffarel e, hoje, presente em muitos países dos vários continentes.

 

A reunião mensal de cada Equipa, um dos pontos concretos de esforço dos membros deste movimento, é uma ocasião de partilha, de estudo, de reflexão, de amor e de estreitamento dos laços que unem os membros que a integram.

 

Esta reunião deve e tem de ser o momento privilegiado de que os membros da Equipa dispõem para reflectir e para se aperfeiçoarem na sua própria preparação, no saber escutar e no exercitar o acolhimento dos outros. A reunião de Equipa pressupõe e exige uma presença séria e participativa dos seus membros, na perfeita percepção dos frutos recebidos e dos dons oferecidos, sempre cientes de que, porque reunidos em nome de Cristo, Ele está com eles.

 

Mas é também em reunião de Equipa que os casais da mesma reflectem sobre a realidade do mundo que os rodeia, sobre o contributo que podem e devem dar ao esforço de re-humanização deste nosso mundo e de que forma lhes será possível ir ao encontro do “próximo” mais próximo para lhe oferecer o amparo que o ajude a suavizar as agruras da jornada.

 

Foi, de resto, isto que aconteceu no seio da Equipa “Ponta Delgada-22” – Sector Açores Oriental das ENS, de que é responsável o casal Ana e Mário Jorge Cabral. Reflectindo, em reunião, sobre hipóteses de intervir em ambientes onde a presença de Cristo pudesse representar uma mais valia, surgiu a possibilidade de ajudar uma franja específica da população a conhecer a palavra de Deus.

 

Da sugestão passou a Equipa ao projecto e, do projecto, à respectiva concretização.

 

E foi assim que, em perfeita articulação com o pessoal técnico da Escola de Surdos-mudos de Ponta Delgada e com o Padre Victor Vicente Arruda, Pároco da Fajã de Baixo e assistente religioso da Equipa Responsável de Sector das ENS, foram desenvolvidas as diligências que conduziram à participação da Comunidade Surda de S. Miguel, acompanhada das respectivas famílias, na celebração eucarística das 18,30 horas de sábado, dia 24 de Abril, na Igreja Paroquial da Fajã de Baixo.

 

O acolhedor templo hexagonal, recentemente beneficiado com importantes melhoramentos, foi preparado para acolher os novos fiéis, recebidos com muita simpatia por toda a comunidade paroquial e, pelo Pe. Victor, saudados com deferentes palavras de boas vindas.

 

Para que a mensagem pudesse chegar às pessoas surdas, foi providenciada a presença, neste acto religioso, de intérpretes de língua gestual portuguesa.

 

Assim, na primeira leitura (Apóst.13,14.43-52) ficaram a saber que Deus é amor, que não há fronteiras para a fé em Jesus, e inteiraram-se das dificuldades dos primeiros cristãos em implantar o reino de Deus na terra; na segunda leitura (Apoc.7,9.14-17), retirada do livro das “Revelações”, o último da Bíblia, aperceberam-se de que os cristãos enfrentavam todos os obstáculos, perseverando numa fé inabalável, desafiando inclusivamente o poder dos soldados romanos, para poderem continuar a demonstrar, com a sua prática de vida, que “Jesus é o Pastor Universal”; e, no Evangelho (Jo.10, 27-30) voltaram a aperceber-se da coragem e do destemor dos cristãos primitivos ao afirmarem que “mesmo que andemos por vales escuros, nada tememos, porque o Senhor está connosco”, tendo isto sido possível somente porque eles estavam, de facto, cheios do Espírito Santo!

 

Também a homilia foi um momento muito próximo para os surdos-mudos presentes ao serem interpelados pelo celebrante sobre a forma como têm vivido o seu baptismo, a sua fé no Senhor, e que propósitos os animarão no futuro. – “Ficamo-nos por aqui, por esta eucaristia, ou vamos dar um passo em frente? Isso depende de vós, dos vossos propósitos, das vossas iniciativas. Fiquem contudo com a certeza que esta é também a vossa Igreja, que Deus é também vosso Bom Pastor e que Ele, juntamente com todos nós e com as vossas famílias, estamos ao vosso lado”.

 

A terminar a Eucaristia o Pe. Vítor dirigiu-se de novo aos surdos-mudos exortando-os a que se congreguem, a que criem a sua própria pastoral, a sua própria catequese, a que avancem com outras iniciativas, contando à partida com o apoio e a colaboração do movimento das Equipas de Nossa Senhora e prometendo que a Igreja Paroquial de Nossa Senhora dos Anjos, da Fajã de Baixo, também para eles continuaria sempre aberta.

 

No final da missa, o inusitado “diálogo” entre os surdos e os seus professores e o convívio que se estabeleceu entre as suas famílias e os membros das diversas Equipas presentes e também com a Valentina e com o António Nascimento, Casal Responsável Regional, foram deveras agradáveis e gratificantes, confirmando o que já era tido como certo, ou seja, o grande alcance que esta iniciativa poderá vir a ter no processo catequético e de valorização humanística dos surdos-mudos presentes, que eram cerca de duas dezenas.

 

Foi, de facto, uma feliz iniciativa que, indo ao encontro de uma legítima aspiração das pessoas surdas, que também têm direito à vida religiosa e a que sejam dados passos firmes no caminho para a sua inclusão, premeia sobretudo a atenção da Equipa Ponta Delgada 22 relativamente aos problemas da comunidade e que, pela visibilidade dada às ENS, deverá regozijar o Casal Responsável do Sector Açores Oriental das ENS, a Ana e o Mário Jorge Cabral.

Equipas de Nossa Senhora